Independência, dois gritos e um juiz
Mateus Rossetti de Almeida
Advogado
@mtsrossetti
“Independência ou morte!”
A frase acima é um tanto quanto famosa, imagino que conheçam.
Em 7 de setembro de 1822, Dom Pedro de Alcântara teria gritado essas palavras nas margens do Ipiranga, em São Paulo. Digo teria pois, tal como é observado em inúmeras possíveis ocorrências históricas, não se pode atestar sua veracidade. “Não há consenso histórico”, dizem. Todavia, ainda que o fato possa não ser de fato um fato, fato é: a frase se tornou um símbolo, um marco de nossa história.
E 201 anos após o grito, cá estamos. Independentes!
E independentes chegamos à presente semana. E que semana, meus caros.
Na Câmara Baixa, algumas votações. Nada muito polêmico, uma semana tranquila. O que poderia suscitar alguma discordância, aprovado por acordo. Temas leves, aprovados de maneira acordada. Tudo certo, todos prontos para o feriado.
A curta semana estava morta já na terça-feira.
E então, chegou quarta-feira.
E quarta-feira, dois séculos após o grito da independência, nos presenteou com um novo grito, desta vez advindo de um juiz: um grito de impunidade.
Na escaldante Brasília, em 6 de setembro de 2023, toda uma operação anticorrupção foi apagada.
Apagada.
Sim, o Excelentíssimo Ministro José Antonio Dias Toffoli apagou a maior força-tarefa de combate à corrupção da história. Considerou imprestáveis as provas carreadas na mesma, obtidas mediante acordo de leniência da finada Odebrecht.
Decidiu serem irrelevantes as confissões de corruptos.
Decidiu serem vítimas.
Decidiu que os bilhões surrupiados da nação são…
Bom, não se sabe. Não se sabe o que são. Talvez imagine que o dinheiro recuperado por Estados Unidos, Suíça e Brasil seja ficto. Talvez imagine que os valores tenham sido gerados espontaneamente. Talvez imagine que os pormenores sobre os valores irão facilmente se perder ao longo dos anos, relegando os fatos - estes sim, fatos - a mera…
Bom, a mera falta de consenso histórico.
E talvez, considerando a memória de alguns, a falta de consenso virá à galope.
Mas um consenso creio que restará:
O Ministro entrou para a história com sua decisão.
Parabéns, Excelência.
Parabéns.
E agora, independente, livre - por enquanto -, me resta encerrar, e encerro sugerindo que celebrem.
Celebrem a Independência, pois esta deve ser celebrada. Ainda que não saibamos de fato seus pormenores, nos resta um símbolo: o grito de um homem virtuoso, grito que nos libertou.
Lembrem-se deste símbolo.
E lembrem-se do grito desta semana. Guardem na memória. Outro grito, desta vez largamente documentado. O grito de um juiz tentando reescrever a história. Os pormenores deste, sim, sabemos. E não esqueceremos.